Informação emagrece?

Expresso aqui a minha opinião sobre as informações das mídias não especializadas no sentido saúde e alimentação.

Quando entrei na faculdade, há um tempinho atrás, tomei alguns choques de realidade. Primeiro que a gente começa a fazer nutrição achando que vai aprender a fazer dieta logo no primeiro semestre, hehehe. Segundo que descobre que todas aqueles mitos da nutrição não passavam de mentirinhas.

Mas quando a gente está na faculdade tudo são flores... Depois que a gente forma vê que o buraco é muito, mas muuuuuito mais embaixo. Você começa a ver colegas de profissão se vendendo, aplicando dietas totalmente loucas e indicando produtos sem fundamento. Quando comecei a trabalhar em consultório que vi o quanto era sério esse tipo de

desvio deconduta, e me questionava muito se o lucro era mais importante que a consciência e a ética (afinal, estava chovendo paciente nos consultórios daqueles colegas).

Então, no início, eu achava que era uma fase, e que essas pessoas não sobreviveriam na profissão. Afinal, a máscara cai um dia né gente? Não é aquela história: "colhemos o que plantamos!"?  Todo nutricionista recebe proposta pra prescrever manipulado, pra vender suplemento x ou y, produtos, fazer dietas que vendem e etc... E comigo não foi diferente. Resisti bravamente, escutando várias pessoas falando "desse jeito vai morrer probre", ou "paciente gosta é de pílula, de cápsula. Se não prescrever ele procura quem prescreva". Mas minha consciência sempre falou mais alto. E continuei meu trabalho, pensando que essa moda de perder peso fácil ia passar.

Mas não passou - e pra piorar: aumentou de uma forma considerável. Hoje vejo, além disso tudo que citei aí em cima, pessoas (até bem intencionadas no sentido de incentivar as pessoas a praticar atividade e comer bem) sem responsabilidade nenhuma na hora de divulgar determinadas informações. E mais: nutricionistas, preparadores físicos, médicos e outras áreas colaborando com isso. Além da indústria, que lança produtos e mais produtos, incansavelmente, nas prateleiras de farmácias, lojas 'naturais' e supermercados.

Para elaborar um alimento milagroso é muito simples. Muitas vezes um estudo é divulgado em algum meio de comunicação 'importante'- um jornal, revista, etc. Ex: O Jornal Nacional fala "Um estudo do Jornal Americano de Medicina mostra que comer papel emagrece". De repente, as pessoas correm para comprar estoques de papel - e comer quilos de papel - afinal, ele emagrece.

Mas na verdade o estudo mostra apenas uma evidência. A conclusão real do estudo é "Na pesquisa feita, o grupo (homens de 30 anos, magros, saudáveis e atletas) que comeu folhas de papel, teve uma perda de peso 0,5 kg maior que o grupo que não comeu folhas de papel. Mais estudos são necessários para atestar o benefício das folhas de papel no emagrecimento.".

Viram a diferença? É tudo uma questão de interpretação.

Mas a mídia quer vender, a indústria quer vender... E então é melhor cada um interpretar de um jeito. Pipocam revistas, blogs, folhetos, reportagens, sobre a folha de papel. E a indústria farmacêutica começa a produzir folhas de papel sabor menta, com antioxidante, com vitamina C, com minerais... até surgir a próxima moda.

E porque as pessoas continuam vendendo esse tipo de informação?

Motivo 1: "Show me the money!!!" Quem não quer lucrar? O ser humano é, por natureza, curioso e diferente. A grama do vizinho é sempre mais verde. Que graça tem se você vai numa nutricionista e ela te passa uma dieta 'normal' e seu amigo vai em uma que manda você tomar mil cápsulas, chás, e produtos diferentes? É assim que todo mundo pensa. O diferente vende mais. O inédito vende mais. É como novela: qual tem mais ibope? A novela nova ou o vale a pena ver de novo? Então, as pessoas se apegam a isso e deitam e rolam no sensacionalismo.

Motivo 2: efeito placebo!!! Além desse tipo de informação ser algo diferente, existe o efeito placebo. Quando a pessoa está tomando algo 'diferente', que tem uma 'promessa', ela se dedica involuntariamente a fazer o milagre acontecer (sim, existem estudos que comprovam o bom efeito dos placebos). É praticamente uma questão de fé. Essa discussão é muito sensível: eu penso que não se pode enganar alguém que está te contratando para um trabalho. É como aquelas pessoas do RJ que compraram um apartamento que desmoronou, porque era feito de areia ao invés de algum material mais adequado.

Motivo 3: facilidade!!! É muito mais fácil digitar no google "efeitos do papel no emagrecimento pesquisar" do que encarar uma faculdade, uma especialização, um mestrado ... Quem quer perder vários dias estudando, lendo artigos, fazendo bons cursos, correndo atrás? Poucas pessoas.

A união desses três fatores ainda é patrocinada pela indústria farmacêutica, que move zilhões no mundo inteiro. Então, os profissionais ou não profissionais unem a fome com a vontade de comer: o povo gosta de coisa diferente, a informação está pronta, prometendo tudo que todo mundo quer, e tem um monte de gente usando e funcionando! Tcharam! Passe de mágica!

Lembrem-se sempre de questionar, muito. Questionem até o melhor dos profissionais (esses, inclusive, gostam de ser questionados - ao contrário daqueles que não entendem muito das coisas). Outros irão dizer que você está com inveja, que é "recalque". Eu chamo a investigação de inteligência, curiosidade. Não é duvidar de tudo. É ser coerente. Tem muita gente querendo espalhar informação boa pelo mundo (e ganhando dinheiro com isso, porque não?). Eu acho sensacional acompanhar essas mídias para um obter incentivo extra para perder peso. Mas tornar aquilo uma verdade absoluta, substituindo a informação de um bom nutricionista, médico e preparador físico (com ética!) pode ser um grande erro.

Eu não me corrompi e não pretendo, nos próximos anos da minha carreira. Eu indico mil tipos de produtos porque gosto e sei que aquilo ali é realmente legal. Me preocupo com o jeito de escrever - afinal, há mil formas de interpretar qualquer texto. Eu amo minha profissão, apesar de todas as dificuldades dela. Seria incapaz de fazer algo só porque dá dinheiro. As duas coisas andam juntas: o amor pela nutrição e a vontade de viver financeiramente bem com ela. E não penso somente como nutricionista: vejo médicos, fisioterapeutas, fonos, preparadores físicos, terapeutas ocupacionais, psicólogos e várias outras especialidades da saúde (e fora da saúde também!) tendo o mesmo tipo de preocupação que eu.

Penso, acima de tudo, que, estou lidando com a saúde e com a vida das pessoas. Enganá-las não é o melhor jeito de fazê-las perder peso. pode ser que dê certo passar uma cápsula de algo que sei que não tem efeito colateral mas também não funciona... mas ao meu ver, o paciente tem que saber o que realmente acontece no corpo dele.

Vejo a luta das pessoas que precisam e querem perder peso todos os dias. É uma dificuldade que as vezes, chega a ser triste. Como eu disse acima, vai além da força de vontade: envolve família, psicologia, mudança de hábitos. Além disso, existem pessoas "menos sortudas" que não contam com a facilidade genética de uma composição corporal favorecida.

Aos profissionais corrompidos, só me resta esperar que eles vejam o outro lado da moeda.

Parece papo de nerd (e quem me conhece sabe que eu não sou e nunca fui), mas o lado da ciência é muito legal. Mas mais legal ainda é ser sincero, ético e coerente nas condutas do dia a dia. Se coloque do outro lado da mesa que você entrega sua dieta cheia de promessas e alimentos milagrosos, e pense se é realmente isso que você gostaria de receber!

Um beijo a todos!

Marina

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