Força, Guerreira!

Semanalmente recebo de alguém diversos conteúdos das redes sociais: uma digital influencer que vive dizendo que precisa acumular créditos na academia para o jantar de mais tarde, ou a festa do final de semana que vem. Outra blogueira de moda dizendo que o look é mara porque deixa qualquer mulher bem magra. Uma youtuber reclamando que o short - nitidamente de um número pequeno - não entra. Uma nutricionista dizendo que não é porque #sextou que você pode #jacar.

Sem falar na imensidade de meninas super magras/saradas que vivem reclamando do inchaço pós ou pré férias, necessitando URGENTE de um detox ou uma massagem milagrosa. 

Se está ruim pra ela, imagina para mim?

Essa é um dos primeiros pensamentos que vem a tona quando alguém assiste uma sarada reclamando do inchaço ou do número que, provavelmente, variou do 34 para o 36.

Esse discurso vindo das redes sociais confunde a cabeça de quem está num processo de desconstrução. Pode ser um gatilho para que alguém pense “poxa vida, eu achei que estava super me aceitando, mas nem ela tá satisfeita! Porque eu estaria?”.

Veja que esse pensamento pode não ser tão consciente e claro, mas a mensagem está sendo passada, pouco a pouco, e se fixando sem você nem perceber, formando a crença de que você está totalmente inadequada e que deveria, rapidamente, fazer algo a respeito disso.

Separei aqui alguns trechos que li por aí e decidi comentar sobre cada um: 

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Isso não é equilíbrio. Manter uma atividade física regular e se alimentar cometendo poucos e oportunos excessos é. Malhar para ‘equilibrar’ a ingestão de algum alimento ou bebida é compensação (como a própria frase diz).

O grande problema da compensação é que, além de carregar muita culpa, pode te levar a restrição extrema e até a compulsão. Você pode começar a comer em excesso ‘porque amanhã vai malhar’ ou pode se restringir em excesso ‘porque amanhã não vai ter força de vontade’. E a compensação pode ser encarada, em alguns casos, como um critério para o diagnóstico de transtornos alimentares.

Sem falar na falácia da força de vontade: se a grande questão fosse essa, não teríamos tantos profissionais para ajudar quem pretende melhorar a saúde e/ou perder peso. Além disso, é fácil ter um discurso positivo quando sua posição está favorável. Somos ótimas em aconselhar a amiga que está com crise no relacionamento quando temos nosso coração em paz, em ajudar o amigo doente quando temos boa saúde e sugerir que alguém faça uma atividade física quando estamos com a nossa rotina ajustada. Faça algo para mudar o que te incomoda, mas não se sinta um fracassado e preguiçoso se você não tem #foco, #força e #fé igual a influenciadora.

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A imagem de uma nutricionista pronta para dar bronca e decidir pelo outro o que ele deve ou não comer me causa arrepios. Isso só afasta cada vez mais pessoas que precisam muito de ajuda dos consultórios. O papel do nutricionista é acolher e ajudar no processo de mudança a alimentar, e não  punir e julgar. A escuta e o acolhimento são fundamentais na prática da nutrição e as correções podem e devem ser feitas sem essa carga pesada, como se a nutricionista fosse um ser de jaleco branco, chicote e esporas atrás da mesa. Não tenha medo de pedir ajuda, não tenha medo de mudar. Mas fuja da proposta punitiva que muitos profissionais oferecem.

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Sua bunda é importante para a locomoção, pois faz parte dos seus membros inferiores. É importante que a musculatura dela esteja fortalecida para que você consiga agachar, sentar ou fazer qualquer outro movimento que precise durante o seu dia a dia. Mas isso não quer dizer que ela precisa ser dura. 

Geralmente saímos na rua para nos divertir, trabalhar, pagar os boletos e passear. Nada disso precisa de uma bunda dura, e em nenhum dos locais que você poderia ir terá um medidor de bunda-durice. 

Essa afirmação só pode ser alguém muito 'bunda-mole'!

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Enquanto algumas mulheres sonham em mostrar suas barrigas esticadas carregando seus bebês, outras estão preocupadas em não parecer grávidas, como se estivessem na época da minha avó, onde não era permitido engravidar antes do casamento – e corriam com a noiva para tomar a benção do padre antes mesmo que o novo pedaço da velha parte do corpo começasse a aparecer. Fazia-se de tudo para esconder a barriga. 2018, tempos bem diferentes.

Estar magro é tão fundamental que nem durante a gestação onde inevitavelmente sua barriga cresce você não pode aumentar de tamanho. Entendo e percebo que o começo da gravidez é esquisito para algumas mulheres: seu corpo toma formas indefinidas e diferentes, causando muita estranheza. Mas esse incômodo tem muito mais relação com as novidades e incertezas da primeira gestação do que pelo senso estético. 

Se sentir grande e pesada durante a gestação é algo também comum, principalmente na reta final, onde atividades básicas como amarrar os tênis podem ser desafiadoras. Mas me causa espanto perceber que algumas mulheres estão sendo tão pressionadas a ter um corpo magro que nem a barriga da gestação pode dar seu ar da graça. 

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Cada um tem o direito de se sentir desconfortável no próprio corpo, independente do tamanho dele. Mas você acha mesmo que a pessoa que se expõe 24 horas por dia e posta uma foto de biquini branco em uma pose nada natural está realmente desconfortável com o CORPO? Essa pessoa pode estar infeliz com outras questões e talvez até com algum problema alimentar ou de imagem corporal.

Os pensamentos que talvez surgiriam em quem visse a foto em questão são:  1) 'não vamos comer demais na próxima viagem' 2) 'se tá ruim pra ela, imagina pra mim' ou 3) 'será que se eu comer demais um dia meu short também não vai fechar?'.

As verdades que eu trago: um short só não fecha automaticamente após você comer MUITO se ele realmente estiver MUITO apertado. Após algum tempo, ele fechará normalmente. Se você faz uma dieta MUITO restritiva e quando passa alguns dias fora dessa rotina (inevitável) você pode ganhar UM POUCO de peso. Dificilmente algo suficiente para te fazer mudar de manequim permanentemente. Porque uma pessoa precisa postar uma foto nitidamente posada, num corpo nitidamente MAGRO e falar que um short não está servindo?

Não é Mimimi

Ao contrário de que essa youtuber comentou quando recebeu comentários sobre os riscos de falar dessa maneira sobre o corpo, isso não é mimimi. Isso é sério. São mulheres e homens, jovens e adultos, sofrendo com transtornos alimentares e da imagem corporal. Eu acredito muito que a responsabilidade de informação deve começar com quem comunica, e depois ela pode ser dividida com quem lê. 

Algumas pessoas chegaram a comentar nessa foto coisas engraçadinhas como 'FORÇA GUERREIRA' (e eu confesso que achei engraçado). Mas depois pensei: será que não seria melhor a gente mostrar a gravidade disso ao invés de somente criticar ou atacar?

Porque você segue quem segue

Você pocê pode até me dizer que 'segue só para se divertir'... pra passar o tempo. Ou porque essa pessoa é famosa. Mas sem perceber essas mensagens estão fazendo com que você acredite que só vale a pena viver a vida de maneira #plena se tiver a cintura fina e a bunda dura. Ah, e comer macarrão só se sua nutricionista de estimação permitir, depois de acumular créditos na academia. 

Para se divertir e passar o tempo a gente deve é ler um livro, ir ao cinema, planejar uma viagem, encontrar os amigos, ver um filme, seguir gente divertida e real, cozinhar, aprender algo que não sabe ainda... temos tantas boas e velhas maneiras de felicidade!

Repito o que sempre falo: faça uma limpa constante no seu instagram. É pra deixar de seguir aquele profissional de saúde que só traz soluções milagrosas, a influenciadora que só tem o corpo como conteúdo, a youtuber que precisa fazer um detox na segunda feira e a blogueira de moda que só coloca a roupa se ela estiver magra. 

Vamos seguir aquelas pessoas que não estão totalmente conectadas ao tamanho do manequim, que se expõe com naturalidade e verdade, que nos inspiram, que pensam em quem está vendo aquela mensagem. Que produzem conteúdo que nos fazem refletir e estão abertas a discussão.

O que você acha que pode ser feito a respeito de todo esse cenário? O que você faz a respeito disso?

Comenta aqui!

Até a próxima,

Marina