A noiva obesa

O que o pós parto da Isis Valverde e o vestido de noiva de Carolina Dieckman tem em comum? Uma justificativa e uma verdade. A primeira “é que todo mundo quer sair bem na foto!”, a segunda é que é muito difícil desconstruir idéias com referências desse tipo.

Eu entendo querer sair bem na foto. Eu também gosto de tirar fotos bonitas, você também gosta. Mas o instagram e a super exposição que estamos vivendo impede que as desconstruções sobreponham as justificativas.

A intenção não é crucificar as duas atrizes, mas sim usar suas fotos e falas para questionar a idealização em torno de todos esses momentos que uma grande parte das mulheres vive: casamento, gestação e maternidade. Apesar de achar que elas deveriam refletir no poder que cada foto e comentário feito tem, entendo que elas também foram educadas no mesmo molde que nós, além de viverem num meio onde um dos maiores valores é a aparência física.

Mas acho essencial discutir sobre as reais motivações de postagens no instagram e entrevistas ao Serginho Groisman.

A NOIVA GORDA

Retirada do Pinterest

Retirada do Pinterest

O casamento é ainda visto como um troféu social, que é ostentado não só pela noiva, mas também pela família dela. Para a maioria das mulheres, eu diria, ainda não é apenas uma opção: brincar de Barbie noiva é tão natural e esperado que poucas se questionam se elas realmente querem aquilo ou se foram ensinadas a querer. E a pressão não é apenas que se encontre um belo par, o príncipe, mas também para participar do fantástico mundo do vestido branco e dos bem casados.

Numa época onde princesas da Disney são reinventadas, as atrizes, influenciadoras, empresárias e até realezas alimentam o sonho da marcha nupcial, e então as bridezillas do mundo real se desdobram para se tornarem inesquecíveis no grande dia. Dentre os diversos preparos está o assunto central da polêmica entrevista de Carolina Dieckman: emagrecer.

A noiva assume uma dieta ferrenha para entrar magra num vestido que, em geral, tem um modelo e recorte pouco familiar. Não interessa se ela quer ou não emagrecer para o dia do casamento: fazer dieta para entrar no vestido faz parte da agenda pré nupcial.

O problema é que ter que emagrecer para casar reforça aquela velha idéia: “eu só sou digna se estiver magra” ou “só emagrecendo para ser feliz". Já presenciei, em atendimentos ou informalmente, noivas que quiseram muito perder peso para o grande dia. Ajudei algumas, observei outras. Não espero que essa atitude mude de uma hora para outra, mas uma reflexão sobre o porque dessa obrigação é necessária. E se é uma escolha legítima, um planejamento saudável deve ser feito para ajudar essas mulheres a sentirem mais confortáveis, lembrando sempre que conforto não pode ser peso-dependente. Trabalhar as expectativas dessa noiva, ajudá-la sem causar danos, fazê-la entender que imagem não determina valor e que é somente um dia dentro de vários da vida dela faz parte de uma terapia nutricional efetiva para o tal grande dia.

imagem retirada do pinterest

imagem retirada do pinterest

Outra observação importante é falar sobre todas aquelas mulheres que já passaram da fase da lua-de-mel e estão vivendo a lua-de-fel: “quando eu casei estava tão magra, queria voltar a estar daquele jeito!” - é o que a maioria diz. E aí é importante lembrar dois fatores: provavelmente você estava magra porque se submeteu a uma dieta rigorosíssima, que fugia do habitual, para aquele dia e sua rotina, sua vida e seus afazeres não são mais os mesmos - impossível manter aquele peso X numa vida Y.

Também preciso falar que você não precisa ser magra pra ser gata, que não precisa estar magra pra usar branco, que não é toda mulher que quer emagrecer e, sobretudo, que não é legal passar por ‘tensão pra entrar no vestido'.

A GRÁVIDA OBESA

Além de reforçar que uma noiva gorda de branco é o pior dos mundos, uma das falas da atriz Carolina Dieckman deu um nó no meu cérebro. Ela diz que estava obesa, ‘porque estava com 6 meses de gravidez e tinha engordado 20kg’. Não vou entrar no mérito da quantidade de peso que ela ganhou, mas sim no fato de vincular obesidade a gestação.

Toda grávida ganha peso, é inevitável. Você está gerando uma vida dentro da sua barriga, uma pessoa sairá ali de dentro. Apesar de entender que é muito importante cuidar da alimentação e do ganho de peso excessivo nesse período, e que esse corpo em transformação causa muito desconforto em muitas mulheres, é importante lembrar que obesidade e gravidez são condições diferentes e que nem toda noiva magra é saudável.

Mas voltando a Carolina Dieckman, quando assisti seu entrevista, eu entendi qual é o raciocínio por trás das fotos de pós parto tão clicadas ultimamente.

E aí me lembrei da atriz Isis Valverde, que postou uma foto dias após o parto, em frente ao espelho, com um corpo parecido com aquele pré- gestação. Uma parte a elogiou como “mamãe gata” ou “aff, nem parece que teve filho, que inveja”. Outra parte lembrou que a foto não retrata a realidade de várias seguidoras que, na maioria das vezes, não tem tempo e nem humor pra se produzir pra foto.

Então misturamos isso a Carolina Dieckman sugerindo que obesidade e gestação são a mesma coisa e o prato está feito: não dá pra ser uma mãe ‘fora de forma'. Mamãe gata é o elogio mais desejado e a preocupação em voltar ao corpo pré concepção é uma preocupação que surge antes mesmo da criança vir ao mundo.

Não acho que as mulheres tem que abdicar daquilo que elas entendem como auto-cuidado porque viraram mães, e também me questiono sobre a necessidade de se anular em prol da nova vida que está em casa. Mas refletir sobre a glamourização do momento é essencial. Essas mulheres tem duas coisas que muitas de nós não temos: equipe e demanda.

Adaptado de imagem do pinterest

Adaptado de imagem do pinterest

A equipe é todo o pessoal que está ao redor dessa mãe pra fotografar, pentear, maquiar, cuidar e ajudar com os filhos e a casa. A demanda é aquela que faz parte do mundo das atrizes, apresentadoras e influenciadoras: a audiência.

Elas vendem imagem. A carreira depende disso, em grande. Elas cresceram nas suas carreiras vendendo não só atuação e produtos, mas também glamour e vidas lindas, bem vestidas e produzidas. Como vão aparecer num pós parto descabeladas? Como vão ter um casamento capa da Caras se estiverem ‘obesas grávidas?'.

Aquilo tudo faz parte de um outro estilo de vida, que tem um objetivo diferente dos nossos, meros espectadores de iphone. Não é nosso dever e obrigação parecer com aquilo. Eu não julgo essas mulheres porque não sei o quanto elas também já estão com um olhar viciado e sei que muitas vezes a sede de sucesso é grande e impede que elas reflitam e tentem expor algo diferente. Mas então, já que elas não irão pensar o quanto podem prejudicar várias pessoas com esse tipo de comportamento, cabe a nós discutir o quanto daquilo devemos comprar, aplaudir e desejar.

Eu não acho que toda essa reflexão deve existir para mudar a opinião de alguém, porque cada um pensa da maneira que quiser. Mas acredito no poder desses questionamentos para nós mesmas. Porque queremos tanto um vestido de noiva num número menor, se o objetivo maior é olhar para as fotos pra se lembrar de um momento mágico, que é dependente de amor e independente de peso? Porque o nosso corpo pós parto tem que ser como o pré parto, mesmo passando por tantas transformações que a maternidade proporciona?

Para finalizar, uma sugestão: conversem com mulheres do dia a dia. Com amigas que vocês confiam. Observem mais a rotina de quem tem uma vida semelhante a sua, busque inspirações nessas pessoas de verdade. E acompanhe as redes sociais com mais cautela, mais olhar crítico. Você não precisa detestar a pessoa que posta uma barriga tanquinho pós parto ou que está no #projetonoivinha, mas você pode se questionar se aquilo realmente é, para você, uma fonte de inspiração ou de questionamento.

Até a próxima,

Marina

Anterior
Anterior

PÕE NO COPO: Macarrão ninho (e uma dose extra de espaguete)

Próximo
Próximo

PÕE NO COPO: Macarrão Ave Maria